A CLAUS ROXIN se deve a
reintrodução do velho princípio
da insignificância no Direito Penal, desde
a década de 60 do milênio passado.
Pequenas ofensas ao bem jurídico não
justificam a incidência do Direito Penal,
que se mostra desproporcionado quando castiga
fatos de mínima importância (furto
de uma folha de papel, de uma cebola, de duas
melancias etc.).
Dogmaticamente falando, já não
se discute que o princípio da insignificância
(ou da bagatela, como lhe denominam os italianos
assim como TIEDEMANN) exclui a tipicidade, mais
precisamente a tipicidade material, consoante
recente decisão do STF (HC 84.412-0/SP,
CELSO DE MELLO).
Os penalistas clássicos não admitiam
a insignificância como causa de exclusão
de tipicidade por duas razões: (a) porque
não conheciam a relevância dos princípios
(especialmente os de política criminal)
no Direito Penal; (b) porque concebiam a tipicidade
exclusivamente em seu sentido formal (conduta,
resultado naturalístico nos crimes matérias,
nexo de causalidade e relação de
tipicidade). Ainda é uma grande novidade,
para muitos professores e estudantes, a divisão
da tipicidade penal em formal e material. De qualquer
modo, partindo-se de uma visão constitucionalista
da teoria do delito (cf. GOMES, Luiz Flávio.
Teoria constitucionalista do delito, São
Paulo: RT, 2004), esse desdobramento resulta absolutamente
necessário.
Em suma, já praticamente ninguém
nega a relevância do princípio da
insignificância (ou da bagatela) no Direito
Penal. Não há dúvida que
é um princípio de política
criminal, mas adotada e aplicando diariamente
pelos juízes e tribunais. Dificuldade ainda
existe no que concerne à sua exata configuração
(basta a insignificância da conduta ou do
resultado? Ou ainda devemos também considerar
características pessoais do agente? Qual
seria a medida precisa para se dizer que um fato
é insignificante?)
A jurisprudência brasileira, em cada caso
concreto, vem se posicionando (e, em geral, de
modo absolutamente razoável). Para que
um fato seja reconhecido como insignificante,
muitos fatores devem concorrer.
No âmbito dos tribunais ou contribuições
sociais, por exemplo (crimes tributários,
de descaminho e previdenciários), o critério
central reside no valor mínimo exigido
para que se proceda uma execução
fiscal (STJ, Resp 573.398, Rel. Min. FELIX FISCHER,
J. 02.09.2004). Particularmente no que concerne
ao âmbito tributário federal, no
princípio, consolidou-se o entendimento
no sentido de se aplicar a insignificância
para possibilitar o tratamento da ação
penal em relação aos impostos inferiores
a R$ 1.000,00 (cf. art. 1° da Lei nº
9.469/97 e ainda art. 20 da MP 1.542-28/97 - STJ,
HC 34.281/RS, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA
FONSECA, J. 08.06.2004). Com a entrada em vigor
da Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002,
esse valor foi alterado para R$ 2.500,00.
Até esse montante entende a jurisprudência
que não se trata de valor lesivo (ofensivo)
de modo relevante aos cofres públicos.
Formalmente trata-se de conduta típica,
mas materialmente não está presente
o requisito do resultado jurídico relevante,
que consiste, no caso, no interesse fiscal da
Administração Pública (STJ,
HC 34.281/RS, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA
FONSECA, J. 08.06.2004).
A novidade na matéria, agora, reside na
Portaria nº 49, de 1° de abril de 2004,
do Ministro da Fazenda, que autoriza (a) a não-inscrição
como dívida ativa da União de débitos
com a Fazenda Nacional de valor até R$
1.000,00 e (b) o não-ajuizamento das execuções
fiscais de débitos até R$ 10.000,00.
Ora, se esse último não é
relevante para fins fiscais, com muito maior razão
não o será para fins penais. Débitos
fiscais com a Fazenda Pública da União
até R$ 10.000,00, em suma, devem ser considerados
penalmente irrelevantes. Se sequer é o
caso de execução fiscal, com maior
razão não deve ter incidência
o Direito Penal.
(Fonte:
Instituto de Ensino Prof. Luiz Flávio Gomes)